Cirurgia plástica estética e a responsabilidade do médico

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O Superior Tribunal de Justiça (STJ) define, em sua jurisprudência, que a responsabilidade civil do médico que realiza cirurgia plástica estética é de resultado. Mas o que isso significa?

Inicialmente, cabe pontuar que a atuação médica é uma obrigação de meio.

Isso quer dizer que, ao tratar o paciente, o médico aplica seus conhecimentos técnicos e os meios à obtenção da cura, porém sem assegurar que haja um resultado satisfatório, uma vez que a restauração da saúde do doente não depende apenas da conduta médica, mas também de outros fatores, como as idiossincrasias do paciente, sua adesão ao tratamento e até a sua condição socioeconômica, que influenciam no resultado e no cumprimento das orientações médicas. Entretanto, essa obrigação não se aplica ao cirurgião plástico estético. Já voltamos a ele.

O que diz o Código de Ética Médica

O Código de Ética Médica (CEM), em seu Capítulo III, da Responsabilidade Profissional, define:

É vedado ao médico:

Art. 1º Causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência.

Parágrafo único. A responsabilidade médica é sempre pessoal e não pode ser presumida.

O CEM indica que não se pode presumir a responsabilidade do médico, ou seja, para responsabilizá-lo, deverá ser provada a culpa (imperícia, imprudência ou negligência).

Ainda, a Resolução CFM nº 1.621/2001, que dispõe sobre a cirurgia plástica, considera, em seu artigo 2º, que “o tratamento pela Cirurgia Plástica constitui ato médico cuja finalidade é trazer benefício à saúde do paciente, seja física, psicológica ou social”.

O artigo 3º da Resolução dispõe que, na cirurgia plástica, como em qualquer outra especialidade médica, não se pode prometer resultados ou garantir o sucesso do tratamento. Dessa maneira, o médico deve informar ao paciente, de forma clara, os benefícios e riscos do procedimento.

O artigo 4º, por fim, fixa que “o objetivo do ato médico na cirurgia plástica, como em toda prática médica, constitui obrigação de meio e não de fim ou resultado”.

Entretanto, jurisprudência do STJ entende de modo diverso. Vejamos:

O que diz a Jurisprudência do STJ

Considerando que, de acordo com o entendimento da doutrina e jurisprudência brasileira, o médico é um prestador de serviço e, por isso, tem sua atuação regulamentada pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), o STJ considera que nas cirurgias plásticas de embelezamento, aplica-se a inversão do ônus da prova, ou seja, o médico deve demonstrar que os resultados danosos não decorreram de sua atuação, mas de fatores alheios, como motivo de força maior, caso fortuito ou mesmo de culpa exclusiva da ‘vítima’ (paciente), sendo a comprovação feita por meio de perícia.

Essa decisão está no Recurso Especial nº 236.708 – MG. Na ementa do acórdão, há a diferenciação entre obrigação de meio e de resultado e a possibilidade da inversão do ônus da prova:

  1. No caso das obrigações de meio, à vítima incumbe, mais do que demonstrar o dano, provar que este decorreu de culpa por parte do médico. Já nas obrigações de resultado, como a que serviu de origem à controvérsia, basta que a vítima demonstre, como fez, o dano (que o médico não alcançou o resultado prometido e contratado) para que a culpa se presuma, havendo, destarte, a inversão do ônus da prova.
  2. Não se priva, assim, o médico da possibilidade de demonstrar, pelos meios de prova admissíveis, que o evento danoso tenha decorrido, por exemplo, de motivo de força maior, caso fortuito ou mesmo de culpa exclusiva da “vítima” (paciente).

O acórdão esclarece que a obrigação assumida pelo médico é, normalmente, de meios, e que a natureza da obrigação assumida nas cirurgias plásticas estéticas ainda não está pacificada na doutrina. Entretanto, o STJ, por ser um tribunal de precedentes, tem se posicionado de maneira a considerar que o médico assume a obrigação de resultado na cirurgia meramente estética. Faz, ainda, distinção entre a cirurgia plástica estética e a reparadora, considerando que, na cirurgia plástica reparadora, que cuida da correção de deformidades hereditárias e congênitas, acidentes e outros males, a obrigação é de meio.

No REsp 985.888, julgado em 16/02/2012, a 4ª Turma do STJ, decidiu que, ainda que na cirurgia plástica estética a obrigação seja de resultado, “não se aplica a reponsabilidade objetiva pelo insucesso da cirurgia, mas mera presunção de culpa médica, o que importa a inversão do ônus da prova, cabendo ao profissional elidi-la de modo a exonerar-se da responsabilidade contratual pelos danos causados ao paciente, em razão do ato cirúrgico”.

Além disso, firmou o entendimento de que o caso fortuito ou a força maior podem ser apontados como causas excludentes de responsabilidade, apesar de não estarem previstos expressamente no Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Por fim, análise da ementa do REsp 1.180.815 – MG, traz:

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. ART. 14 DO CDC. CIRURGIA PLÁSTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. CASO FORTUITO. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE.

  1. Os procedimentos cirúrgicos de fins meramente estéticos caracterizam verdadeira obrigação de resultado, pois neles o cirurgião assume verdadeiro compromisso pelo efeito embelezador prometido.
  2. Nas obrigações de resultado, a responsabilidade do profissional da medicina permanece subjetiva. Cumpre ao médico, contudo, demonstrar que os eventos danosos decorreram de fatores externos e alheios à sua atuação durante a cirurgia.
  3. Apesar de não prevista expressamente no CDC, a eximente de caso fortuito possui força liberatória e exclui a responsabilidade do cirurgião plástico, pois rompe o nexo de causalidade entre o dano apontado pelo paciente e o serviço prestado pelo profissional.
  4. Age com cautela e conforme os ditames da boa-fé objetiva o médico que colhe a assinatura do paciente em “termo de consentimento informado”, de maneira a alertá-lo acerca de eventuais problemas que possam surgir durante o pós-operatório.

Como se vê pelas decisões acima, na cirurgia plástica estética, o médico assume a obrigação de resultado, ou seja, se compromete em assegurar o resultado estético ao paciente. Todavia, não há responsabilidade objetiva, sendo factível que o médico demonstre que os eventos danosos não advieram de sua conduta, mas de fatores externos, como caso fortuito, força maior e culpa exclusiva do paciente. Em outras palavras, cabe a inversão do ônus da prova e deve o médico provar a causa que exclui a sua responsabilidade.

Para atuação mais segura, respeitando a boa-fé contratual e a ética profissional, é importante que o médico converse sempre com seu paciente antes da cirurgia e explique se há possibilidade de resultados satisfatórios ou se há limitações ao desejo do paciente. Em certos casos, em que não será possível o resultado satisfatório, o médico deve explicar ao paciente e negar a realização do procedimento.

Além disso, é importante que o médico siga as recomendações do Conselho Federal de Medicina e o Código de Ética Médica: anote as consultas em prontuário médico, solicite os exames pré-operatórios necessários ao caso, estabeleça uma comunicação clara e objetiva com o paciente e obtenha o consentimento livre e esclarecido antes da cirurgia, detalhando eventuais problemas e sequelas que possam surgir no pós-cirúrgico, bem como todas as recomendações médicas que devem ser seguidas pelo paciente no pré e pós-operatório.

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