Erro médico e a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

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Qual Código deve ser aplicado ao erro médico – o Código Civil ou Código de Defesa do Consumidor?

O erro médico pode ser analisado no ordenamento jurídico brasileiro por meio do Código Civil (CC) e Código de Defesa do Consumidor (CDC). Há, atualmente, correntes que defendem a aplicação de um ou outro, sendo o CDC mais aceito.

O Código de Defesa do Consumidor dispõe em seu artigo 2º que “consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”.

O art. 3º, dispõe que “fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”.

O § 2º do mesmo artigo conceitua o que é serviço, explicando que “é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”.

A questão que se coloca é quanto a natureza da relação médico-paciente – médico e paciente se adequam aos conceitos de fornecedor e consumidor?

Pode-se dizer que há duas interpretações na doutrina – entendimento doutrinário majoritário é de que o médico é um prestador de serviço e o paciente é o destinatário final do serviço oferecido pelo médico, caracterizando uma relação de consumo, em que o médico é o fornecedor, o paciente é o consumidor, sendo aplicável o CDC.

Sérgio Cavalieri Filho defende essa corrente, afirmando que “o médico é um prestador de serviço pelo que, não obstante subjetiva a sua responsabilidade, está sujeito à disciplina do Código do Consumidor”.

Note que ainda que se admita a aplicação do CDC na relação médico-paciente, não se considera que o médico tenha responsabilidade objetiva.

A responsabilidade médica é subjetiva, de acordo com o art. 14, § 4º, do mesmo código, que dispõe que a responsabilidade civil dos profissionais liberais será verificada mediante a apuração da culpa. Isso quer dizer que além da conduta, dano e nexo causal, também deverá ser comprovado que o médico agiu com negligência, imprudência ou imperícia, espécies de culpa.

Outra corrente doutrinária afasta a incidência do CDC e considera que nas demandas por erro médico, em que a responsabilidade é subjetiva, deve ser aplicado o Código Civil, que dispõe no art. 951 o dever de indenizar àquele que “(…) no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho”.

Essa corrente é minoritária e considera que a relação médico-paciente não é consumerista, por se tratar de relação intuito personae, baseada na confiança. Também entende que vida e saúde não são simplesmente produtos, o que afastaria a incidência do CDC.

A Jurisprudência admite a aplicação do CDC em demandas de erro médico

A jurisprudência brasileira, entretanto, move-se no sentido de admitir a aplicação do CDC na relação médico-paciente, considerando que há relação de consumo.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendimento consolidado, admitindo a aplicação do CDC, inclusive com a inversão do ônus da prova nas demandas de erro médico, desde que cumpridos os requisitos da verossimilhança das alegações e da hipossuficiência (técnica) do autor.

Ao considerar a aplicação do CDC em demandas de erro médico, o paciente é beneficiado. Farias, Braga Netto e Rosenvald, pontuam que pode ser aplicado:

  1. Possibilidade de inversão do ônus da prova a favor do paciente (CDC, art. 6º, VIII);
  2. possibilidade de propositura da ação no domicílio do consumidor (CDC, art. 101, I);
  3. O prazo prescricional mais dilatado (CDC, art. 27);
  4. deveres de informação, por parte do médico e instituições de saúde, particularmente severos (CDC, arts. 6º, III, 8º e 9º);
  5. Invalidade de cláusulas contratuais que excluam ou mesmo atenuem o dever de indenizar em caso de dano (CDC, art. 51, I).

 

Concluindo, a aplicação do CDC em demandas de erro médico ainda não é unânime na doutrina e na jurisprudência, mas atualmente há entendimento majoritário de que o médico é o fornecedor e, o paciente, o consumidor.

A interpretação de que se enquadram como fornecedor e consumidor conforme disciplina o CDC, torna-se possível a aplicação desse Código à relação médico-médico, o que beneficia o paciente.

 

 

Referências:

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 13 ed. São Paulo: Atlas, 2019.

FARIAS, Cristiano Chaves de; BRAGA NETTO, Felipe Peixoto; ROSENVALD, Nelson. Novo Tratado de Responsabilidade Civil. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2018.

 

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